“Divino e
humano junto” (6M 7,9)
Introdução
 |
| Fr. Pablo Ureta, ocd |
Em janeiro de 2003, o Padre Jesus,
castelhano, especialista no campo da espiritualidade cristã e professor no
Teresianum, em Roma, esclareceu algumas coisas sobre o sentido da sagrada e dos
místicos. Ele fez isso em uma entrevista concedida à agência de notícias Zenit.
Encontrou em suas respostas um primeiro contato vital no sentido da mística e
dos místicos cristãos e de suas experiências.
Entre outras coisas afirmo, e com
razão, de que há mais místicos autênticos dos que se pensa; que os místicos têm
uma experiência cristã e eclesiástica muito próxima aos problemas da vida da
Igreja, com capacidade de abrir novos caminhos para a evangelização; que os
verdadeiros místicos são pessoas cheias de realismo, equilíbrio, humanidade,
capacidade de ação e de relação, de criatividade. Finalmente, que a verdadeira
mística esta muito longe de ser uma fuga da realidade porque, se é autêntica,
lança as pessoas no caminho da historia.
Também sublinhou o fato de que
nem todos os místicos têm a mesma função. “Em alguns prevalece à graça do
conhecimento de Deus e de seus mistérios para confirmar na fé. Em outros está à
graça da renovação pessoal e comunitária; em outros há também uma graça da
profecia e uma missão eclesial política. Penso em Catarina de Sena, em Brígida
e inclusive em Edith Stein, que escreveu a Pio XI em defesa de seu povo. Por
isso as três são místicas do seu tempo... Existem místicos que tem a função
profética na Igreja e no mundo: afirmar sua santa vontade com forças os
direitos de Deus contra os abusos dos poderosos”. 1
Estas declarações, feitas por um
especialista na área, me parece muito oportunas para não confundir a experiência
mística cristã com revelações e mensagens que hoje estão à ordem do dia, e se
difundem de muitas maneiras. Karl Rahner, falando em geral do crente do futuro,
afirmava que ser um “místico”, é dizer, alguém que há “experimentado” algo, ou
não seria mais um crente. Com esta afirmação, queria sinalizar que no futuro,
de fato já no presente, a fé não se pode apoiar em um ambiente de cristianismo
que cria uma atmosfera favorável as convicções religiosas2. O crente é alguém
que, através do microscópio da sua fé, descobre a Deus presente em todas as circunstâncias
e O contempla nas pessoas. Esse é no fundo o sentido da necessidade que tem um
crente em ser místico. Ele é chamado a dar testemunho da realidade de um Deus
que vive e é próximo.
Experiência humana no lugar da experiência de Deus
“Divino e humano junto”1 é a
expressão teresiana que pode resumir sua experiência pessoal e sua experiência
de Deus, é falar seu modo de conhecer e experimentar Deus. Ainda que possa soar
tema banal, falar que Teresa de Jesus é “mestra de oração” é reconhecer que é
“mestra da humanidade”, “mestra da vida”, porque precisamente a sua experiência
de Deus se inscreve nas estranhas de sua trajetória vital e de sua experiência
humana.
Deve trazer aqui o que o P.
Saverio C, expressou em uma conferencia no mês de agosto passado, falando sobre
“A contribuição de Santa Teresa à vida contemplativa”.
“A originalidade de Teresa se
manifesta... no fato de introduzir estas noções (de oração e contemplação) no
contexto, melhor, “em carne” de uma experiência pessoal, de uma comunidade
religiosa e de uma situação histórico-eclesial concreta. Isso leva a Teresa inevitavelmente
a mudar o centro de seu discurso (de oração ou contemplação) a pessoas em suas
dimensões constitutivas: as relações que ela vive na historia em que participa.
”2
Abordar a experiência espiritual
e mística de Teresa é entrar em uma das coordenadas mais importantes de sua
existência, já que há sido a área em que a busca e o caminho existencial
tornaram-se polarizados, onde ocorreu a experiência fundamental de sua vida: o
encontro com Deus. O descobrimento de sua vocação, sua autocompreensão, ou
seja, desde onde vive até rever a própria trajetória de vida, através do prisma
pelo qual se olha e valoriza as coisas, os acontecimentos e as pessoas, que estão
estreitamente vinculados aos elementos que configuram seu próprio mundo
religioso.
Não se pode compreender Teresa em
sua época sem sua referência de vida à transcendência, a Deus. Vive inserta em
seu tempo e participa de suas buscas e problemáticas. Nela, a vivência
espiritual não ocorrerá à margem de sua realidade humana (social, familiar e
pessoal), senão como caminho transitado entre as luzes e sombras de sua
humanidade, âmbito, este, que viverá o encontro e a relação com Deus.
Passar do “mundo religioso” a
“experiência de fé”, há sido fruto de sua historia pessoal, assumida e madurada
em seus acertos e erros, até descobrir-se buscada e amada por Deus. Sua
vulnerabilidade fez poder sintonizar com as experiências de homens e mulheres
que hão vivido a busca de Deus desde sua condição de “pecadores perdoados”3.
Sua fragilidade humana vivida muitas vezes como infidelidade a Deus, ou
simplesmente como limite, se volta como tela de fundo em que se projeta sua
experiência de Deus.
O realismo da experiência
espiritual de Teresa de Jesus se valoriza ao prestar atenção ao que se há
implicado poder avançar, lutar e assumir as experiências do fracasso, até
alcançar uma maturidade que permita integrar todos os aspectos da historia
pessoal, enriquecidos com a perspectiva que aporta o foco e a experiência da
fé.
A trajetória vital de Teresa de
Jesus, vivida com intensidade, fez com que experimentasse a fundo sua condição
humana, inserida nas coordenadas históricas de sua época e nos elementos
próprios que constituirão sua existência humana. Tudo isso implicou em um
processo e um caminho de maturação, um assumir as condições específicas e reais
do humano, mais não ficando preso a eles, indo mais além. Teresa viveu a
profundidade do humano, e ali teve a experiência com Deus.
Esta experiência pessoal, única e
intransferível, levou-a a viver e descobrir umas pistas para lograr realizar
seu caminho e responder ao projeto de Deus. Logo ela mesma as converterá em
proposta para suas filhas e para todo aquele que queira “Ser servo do Amor”,
seguindo a Jesus pelo caminho da oração.
Experiência de Deus que transfigura o humano

A experiência de fé e espiritual
de Teresa pode ser interpretada tendo em conta o elemento humano, em sua
dimensão imanente e transcendente. Nem Teresa, nem a pessoa humana são
entendidas apenas de si, mas deve ser encaminhada para o nível transcendente, a
verdade do homem revelada por Deus.
Sua vivência espiritual e a
experiência de Deus têm enriquecido o seu dinamismo humano gerando um processo
de humanização. Teresa faz referencia em seus escritos. Isso há permitido a ela
descobrir e encarnar uma espiritualidade humanitária, através de uns pontos ou
pautas de atuação que assumem a realidade, orientando-a e reforçando-a. Estes
pontos são:
A determinada determinação resume
e expressa a decisão firme de se comprometer no caminho da consagração a Deus,
que Teresa viveu como libertação da própria existência, e como modo de
compromisso eclesial e social. Implica assumir a dimensão de crucificação da
vida, resistindo aos combates do ambiente, vivenciando os temores que paralisam
desde o interior da pessoa, e da própria realidade corporal, assumindo a
serviço do Reino. É, em definitivo, viver radicalmente a busca e o cumprimento da
vontade de Deus como opção fundamental.
O empenho por orientar toda a
existência em torno da pessoa de Cristo, e o encontro transformador com Ele,
constitui a chave teológica mais importante no itinerário teresiano. Em torno
desta realidade se há produzido a maior libertação e maturação de Teresa, dando
sua afetividade uma dimensão mística, junto gerando uma experiência mística com
profundas ressonâncias humanas e afetivas. O seguimento de Cristo significou a
inserção em seu mistério Pascual, e a configuração da sua própria vida com a Dele.
Cristo constitui todos os aspectos da ação humana, polarizando a energia vital
e emocional, ao mesmo tempo em que unificando o coração, orientando e dando
sentido a vida de Teresa. Fazer próprios seus interesses, sua causa. Servir ao
hóspede4.
Como conseqüência e exigência do
encontro com Cristo e para configurar a própria existência com a sua, - em uma
sinergia entre a natureza e graça-, aparece à necessidade do dinamismo
virtuoso, ou seja, atitudes que favoreça e expressem a condição da “nova
criatura”. Teresa falara, desde sua própria experiência, de três formas em que
se manifesta este dinamismo e suas atitudes:
·
A capacidade de desejar e de ter “grandes
desejos”. O dinamismo do trabalho teológico de transformar e purificar a
capacidade da consciência de “ser agraciados”5, incorporando a experiência da
própria pobreza. Deus não se define através dos desejos humanos, senão que é
Ele quem os redimensiona. O desejo, purificado e madurado, se converte em
expressão de dinâmica teológica.
·
Outra atitude é a do autoconhecimento e da
assunção da própria verdade, através do conhecimento de Deus. Em Teresa se há
manifestado a busca de autenticidade existencial. Este autoconhecimento é
proposto por ela com insistência, e se realiza em um âmbito de oração. Implica
um movimento de introspecção e de auto-transcendência, passar da “Busca em Ti”,
a “Busca em Mim”. Em Deus se descobre a verdade e a identidade mais profunda do
homem, desde sua condição de imagem de Deus, caído e redimido.
·
Terceiro âmbito e atitude, o amor e sua
maturação humana e teológica. O encontro pessoal e transformador com “Cristo
encarnado” tem preenchido e planificado os desejos mais profundos. Amor
liberado da posse, com a intenção de entregar as profundezas pessoais
(sacrificial) e abertas para acolher a todos (universal) e criar comunidade. A
experiência teológica purifica e leva mais além do nível humano, conservando
suas características pessoais.
Sagrada multiplicada
A maturidade que alcançou Teresa
em seu processo se manifesta principalmente em uma atitude de profunda
liberdade interior frente a si mesma e aos demais; “domínio” fruto da entrega
total de si a Deus, vivendo no seguimento de Cristo, com determinada
determinação6. A ele se inclui o trabalho das virtudes humanas e teológicas,
que transformarão a capacidade de desejar, o conhecimento de si e a capacidade
de amar e responder aos desafios da historia.
12. Todo este dinamismo desemboca
em uma existência abundante, próprio de quem realiza sua liberdade dando e
servindo a exemplo de Cristo, com quem se identificou. Neste estado, o
conhecimento da própria pobreza se a aprofundado, ao mesmo tempo em que se vive
uma serena confiança em Deus. Aqui, a união com Ele é a que gera um movimento
constante de serviço de verdadeira eficácia, abundância e valor dos trabalhos.
13. “Chegada uma alma aqui, não é
só desejos que têm por Deus; Sua Majestade dará forças para por em obras. Não
se coloca coisa adiante, em que se pensa em servi-lo, a que não se balance:...
vê claro que tudo é nada, senão contentar a Deus”8.
A liberdade vivida e proposta por
Teresa é expressão de crescimento que corresponde, integra e projeta em todas
as áreas de sua existência:
·
Frente à
dimensão corporal e a experiência de fragilidade, a liberdade se traduz em
superação do medo a sofrer e “dominação” frente às demandas do próprio corpo.
·
Na dimensão emocional, a opção por Deus e pelo
encontro com Cristo configurador invadiu as profundezas do coração,
concentrando-se e liberando sua capacidade de amar, sem amarras, com profundo
amor e se estabeleceram na entrega e serviço.
·
Deus é a fonte pela qual Teresa se percebe e se
valoriza. Nele descobre sua verdadeira dignidade e sua miséria9, e também o
verdadeiro valor das coisas. Desde Ele também se justifica toda renúncia e a
“mortificação do próprio eu” para orientar e canalizar os seus desejos e as
suas energias para o que é seu "único bem".
·
A liberdade, em sua dimensão social e histórica
foi refletida como "domínio" na frente das coisas e dos critérios de
avaliação sociais, a que tem um olhar crítico, mas não amargo, mas construtiva,
porque eles se sentem desafiados e engajados com história, da parte de Deus.
A experiência espiritual e
mística transformou a dimensão religiosa. O dinamismo teológico amadureceu e
fortaleceu todas as áreas da vida de Teresa, unificando e dando sentido à sua
existência e fazendo-o frutificar para os outros.
Estes são alguns pontos chaves,
de aproximação a experiência espiritual de Teresa de Jesus, em seu dinamismo e
seu processo de crescimento, considerando desde a interação entre natureza e a
glória.
Espiritualidade humanizada

Na experiência pessoal de Teresa,
a realidade pessoal com toda sua carga de limites e possibilidade, foi
necessária para resgatar o valor humano como lugar onde se dá a experiência de
Deus e o encontro com Ele. Também a importância da experiência do limite (até
mesmo do pecado), assumidos, com realidades que podem abrir a uma experiência
de Deus, realista e esperançosa.
O substantivo humano de Teresa,
desde suas condições pessoais e próprias da época, é um cenário onde se realiza
seu projeto pessoal posto a serviço do Reino.
Importante destacar que o
crescimento e a plenitude humana e espiritual alcançada por Teresa consistem
não somente nos feitos extraordinários da vida mística (nem se passa por
alcançar uma “perfeição” equivalente a uma ausência de limites e defeito),
senão em levar a plenitude da gloria do batismo. Esta por sua vez, vivida no
encontro pessoal com a transformação com Cristo-Homem, desde a leitura e assume
a própria humanidade e sua historia, sobre tudo, na união amorosa com a vontade
de Deus. Como disponibilidade total no seu projeto e seu querer, expressados em
sua própria condição e realidade pessoal. Trata-se, por tanto, de elementos
antropológico-teológicos universais e válidos para todo o que crer.
A experiência humana concreta de
Teresa, desde os elementos que configuram, constituído um dado geral e, ainda
que em cada indivíduo assume matizes próprias, no fundo é igual para todos em
suas coordenadas essenciais. Assim, no caso de Teresa, seu próprio itinerário
existencial é suscetível de uma releitura de projeção universal.
A profecia mística
Cabe aqui perguntar: o processo
de Teresa e sua experiência com Deus, que pontos aportam para uma
espiritualidade hoje? Qual a profecia de sua crença?
Em primeiro lugar podia afirmar,
desde a experiência de Teresa, que a oração constitui um tanto “uma prática de
devoção”, quanto “modo de ser fiel”.
Viver a amizade com Deus
determina um modo de viver e encarar a vida. Deste este ponto tem que
interpretar toda sua experiência e seu mestre espiritual. A oração é expressão
profunda da dimensão religiosa do homem, que implica sua totalidade gerando um
processo dinâmico e totalizador de crescimento e transformação profunda, como
sinaliza C. García: “ se descobre sua dignidade e seu próprio interior, se abre
a transcendência; acredita em uma nova realidade e um novo dinamismo; é fonte
de liberdade e unificação interior; encontra a comunhão com Deus uma plena
realização pessoal e é origem de uma nova presença no mundo e de uma maior
projeção na historia”.10
Trata-se, por tanto, de uma
experiência antropológica (por se “relação pessoal”) e teológica (tratar com
Deus). A luz do que foi expresso, podemos falar que em Teresa, sua experiência
e sua pedagogia de oração resultaram em um caminho de reconstrução de uma
pessoa desde suas raízes mais profundas de seu ser.
Teresa aprendeu a conhecer sua
condição humana “padecendo”, assumindo e repassando. Por isso, para ela, nada
de humano é distante de sua relação com Deus, a vida de oração: “nós não somos
anjos, temos um corpo. Queremos fazer-nos anjos estando na terra- e tão na
terra eu estava- é desatino”11. Esta perspectiva repercute a relação com Deus,
e o modo de perceber a relação com Jesus, quem experimenta particularmente
próximo e amigo: “em tempo de seca, é bom amigo Cristo, porque olhamos os
Homens e vemos suas fraquezas, e é companheiro.”12
A oração significa o âmbito onde
se conhece e desde o qual tem que assumir suas realidades de mais conflitos:
ali se há libertado de suas lutas interiores mais intensas e dolorosas: “Por
esta encostada a esta forte coluna de oração, passei este mar de tempestade
case vinte anos...”13. Mais o permanecer nela o significado da possibilidade de
ser curada e transformada mais além da impotência de seus propósitos e empenhos
de vontade: “Seja Deus bendito para sempre! Que com um ponto me deu a liberdade
que eu, com todas e quantas diligencias havia feito por muitos anos, não
poderia alcançar comigo...”14.
O caminho da oração, por tanto,
evidencia ate o ponto, natural e de graça, interagem curando, levantando,
transformando e transfigurando a pessoa. Para Teresa, a oração constitui o
caminho para uma profunda reconstrução humana e espiritual: “Do que tenho
experiência posso falar [...] é no meio por onde posso torna-se a remediar, e
sem ela será muito mais dificultoso”15. Também é caminho de crescimento na fé
para experimentar a Deus sempre de um modo novo16. Desde modo a atitude
simplesmente religiosa, com sua carga de projeção pessoa sobre a imagem de
Deus, se torna atitude teológica que experimenta e acolhe a Deus que se
manifesta, adquirindo uma visão e uma atitude nova sobre Deus, os outros e sobre
a si mesma17.
A espiritualidade vivida e
proposta por Teresa, constitui seu modo de compromisso histórico com a Igreja e
a sociedade, concretizando sua obra fundação e seu projeto espiritual posto em
mãos de mulheres,18 mais abertos a todos.
Teresa “apesar” de sua condição
de mulher e freira (pelo que implicava em seu contexto histórico), há
conseguido abrir uma brecha no muro levantado para a mulher de seu tempo, e
traçar um caminho de valorização, dignidade e compromisso, tendo sua raiz em
Deus, projetando na historia. Ainda que ela não formulasse explicitamente, pode
dizer que chegou a descobrir a força profética e transformadora “dos pobres” (encarnados
na situação da mulher), e a apostar pelo valor da pessoa por cima de sua
condição social (“a honra”), raça ou sexo, gerando um novo tipo de relação
(igualdade e fraternidade), desde as que constroem a Igreja (no estilo de Jesus
de Nazaré) e também na sociedade.19
O estilo profético teresiano não
é de resposta violenta nem agressiva, mais a hora de defender as possibilidades
da mulher (ela e sua freiras) não poupa esforços ou argumentos que propõem, a
saber, quando não se fala Deus na oração.
Por tanto, a garantia da obra do
Espírito se manifesta nela, em seu olhar lúcido e critico sobre a realidade
social e eclesial, resistindo a quem seja contrario, aportando com o próprio
testemunho aquele que faz falta, mais sempre fazendo pontes de comunhão, em
obediência criativa, dialogando e questionando – se é necessário- ainda para a
mesma autoridade. Sem violência, nem amargura, acatando quando a realidade se
impõe, e sabendo esperar o tempo oportuno.
Sua proposta comunitária “de
base” é o modo de “ser” Igreja e de aportar a sociedade um modelo de vida ético
e evangelista, sobre o reconhecimento da igualdade digna de todos, por cima da
condição social ou de sexo.
A. A espiritualidade vivida
e proposta por Teresa de Jesus implicam um caminho espiritual de experiência
com Deus, que se traduz em um modo novo de olhar e valorizar as pessoas e os
acontecimentos, de transformação pessoal, e de presença e compromisso com os sinais
da historia, que em absoluto pode estar distante do autêntico orador.
B. A proposta Teresiana implica um caminho de introspecção e
interiorização que aprofunda o próprio conhecimento e a busca pela identidade
pessoal mais profunda, aberta a transcendência e ao outro. Para Teresa é vital
aprender a conhecer-se, mais este conhecimento se aprofunda e eleva a busca e o
encontro com Deus. A pessoa de Jesus dá a chave do verdadeiramente humano, a
luz de sua realidade original.
As espiritualidades teresiana,
como sabem parte da concepção do homem em sua dignidade original de imagem e
semelhança com Deus, e do fato de estar “habitado” por Ele. Para Teresa toda
pessoa tem uma sétima Morada em seu interior, nas que habitam o mesmo Deus, nas
que se encontram a fonte de sua dignidade e felicidade. Por esta plenitude do
homem se encontra a possibilidade de chegar ate o “fundo da alma”, e alcançar a
união transformadora com Deus. Desde esta ótica, pode considera o itinerário
das Morada como um caminho de cura e reconstrução (“purificação”) do homem até
chegar a contemplar se “tal como é” em Deus, participando da sua mesma vida,
caracterizada por uma plenitude de liberdade e de amor, vivida como entrega,
serviço e irradiação de uma existência transformadora.
A plenitude para Teresa consiste
em uma existência cristificada, é dizer, a configuração com Cristo: esta é a
maior graça que pode fazer Deus ao homem, “dar-nos vida que seja imitando a que
se viveu seu Filho tão amado”20.
Esta é a verdade mais profunda do
homem, sua dignidade e valor original, e desde aqui é vista a condição da
existência com sua realidade do pecado e miséria, que hão de ser assumidas em
toda sua essência, para poder ser redimidas e transformadas pela graça.
Aqui, o realismo da
espiritualidade teresiana configura na visão do homem destas realidades. Sabe
que o coração anseia uma plena liberdade e amor, mais junto experimenta, muitas
vezes, a existência como um pesada carga que impede a realização de seus
anseios.
A experiência do mal e do pecado,
Teresa os constata na “desfiguração” e prostração que
o homem sente quando “não se faz o bem que quer, senão o mal que não quer”.23
Frente aos limites e obstáculos concretos que provem do contexto, ou do próprio
interior do individuo, e que desfigura a verdade pessoal, Teresa a descobre em
Deus.24
C. 39. A fragilidade e a própria vulnerabilidade – experiência
universal da condição humana-, Teresa há experimentado com intensidade
particular, e há sido o “lugar” desde o qual há vivido o encontro com Deus.
A experiência espiritual
Teresiana se dá em sua luta por superar as dificuldades, seu próprio itinerário
interior, vivido muitas vezes desde a impotência e o fracasso, e sua
consciência permanente de fragilidade e vulnerabilidade. Sua força interior,
seu empenho decidido e sua capacidade de luta há tido que ser acrisolados e
reduzidos a máxima impotência e pobreza para poder ser convertida e
transformada pela graça.
Teresa há tido que descender até
o mais profundo de seus próprios infernos, e ali a tido a experiência de ser
buscada, resgatada e redimida. Um corpo marcado pela fragilidade e a
enfermidade, uma afetividade descentrada e insatisfeita, um contexto social
condicionante e marginador, uma Igreja divida e em crises, e uma experiência de
vida religiosa decadente, são elementos da realidade humana por assumir e desde
o qual caminhar.
Somente quando assume sua
realidade e a experiência profunda de sua impotência, é quando chega a estar em
condições de abrir-se a obra da graça: “Procurava remédio, fazia diligencias,
mais não devia entender que aproveitava pouco, tirava de tudo ponto a confiança
em nós, não colocamos em Deus”. Sua própria pobreza se há transformado na
possibilidade para descobrir um caminho da espiritualidade que se realiza
“desde abaixo”, é dizer, desde a pobreza, a fragilidade, as carências e os
limites. A experiência humana e espiritual de Teresa fez encontrar um paradoxo
paulina: na fragilidade resplandece melhor a graça, liberando de ocultas autoafirmações
e consolidando na verdadeira humildade, como
chegar a dizer: “é vontade mostrar sua grandeza algumas vezes na terra que é
mais ruim”.
D. Entre as realidades humanas vividas (sofridas e gozadas) por
Teresa, está a amizade, que ocupou um posto de grande significação em sua
experiência humana e que será a chave de sua espiritualidade. Possui uma grande
sensibilidade para com a amizade, tanto no plano humano, como no espiritual.
Pode dizer que Teresa a feito sua
tendência natural (e até sua necessidade de relacionamento) caminho e modo de
encontro com Deus. No reino das emoções, sabemos que o mundo das relações
significou um risco e uma possibilidade. Faz falta aprender a harmonizar as
demandas do mundo interior com as exigências humanas da fé.
“Grande mal é uma alma
sozinha”,27 é a conclusão de Teresa ao olhar para trás e reler seu caminho.
Sabe que assim como no plano humano não nos realizamos se não é em comunhão e
abertura aos demais, do mesmo modo – e ainda mais- no plano espiritual, as
amizades são necessárias, importantes e de grande ajuda. “É coisa
importantíssima” ter amigos com quem compartir ideais e afetos, lutas e
dificuldades (“ que de tudo tem os que têm oração”),28 para ajudar uns aos
outros. Ademais “cresce a caridade com a comunicação, e não existem mil bens
que ousaria a falar senão tivesse uma grande experiência em no muito que vai
isso”. Há que procurara-las ao começar o caminho, alimentá-las durante a
caminhada, e acolher a elas nos momentos de dificuldade. Para Teresa, o caminho
da fé, sendo sempre “pessoal”, é sempre “com outros”.
Característica desta amizade
humana e espiritual é a “reciprocidade” e a “gratificação” (amor
desinteressado): amor de um para o outro, mais correspondido por este. Por sua
parte, o amor autêntico esta aberto a fazer o bem a todos (não se fecha para
alguns poucos).
O “desinteresse” (gratificação) é
essencial a este tipo de amor e amizade, caso contrário, os despojos e degrada,
e gera relações manipuladoras e injustas. O Amor evangélico vivido e proposto
por Teresa é semente de um novo mundo: “com que amizade se trataria todos, se
faltasse interesses de honra ou de dinheiro. Tenho para mim que corrigiria
tudo”.31 Por tanto, este amor e amizade, a vez que responde a uma busca humana
e espiritual, é caminho de crescimento humano e teológico, e de transformação
social.
A realidade da amizade, Teresa
projeta a relação entre Deus e o homem, com toda sua carga de intimidade,
comunhão, compromisso, reciprocidade ( na linha da tradição bíblica). A nova
relação entre Deus e o homem, vem qualificada pela amizade: “Já não os chamo
servos, aos senhores os chamo amigos” (Jn15,15). É o modo da relação que Teresa
vive e experimenta com o Deus Amigo e Esposo, expressões carregadas de
intensidade afetiva, humana, teológica, desde as que ela experimento como Deus
satisfez os desejos mais profundos do coração humanos, na busca do amor.
Finalmente, tudo vivido e sofrido
por Teresa em sua experiência espiritual (“humano e divino junto”), terminará
projetando-se como uma luz sobre sua obra de fundação e doutrinal, e na
perspectiva própria, a hora de configurar sua intuição acerca das comunidades
reformadas: fraternidades de “amigas”.32
Como no evangelho, o vínculo que
une a comunidade e que define a pessoa com experiência com Deus, é o da
caridade-amizade: “estas tais almas são sempre aficionadas a dar muito mais que
a receber, ainda com o mesmo Criador que faz acontecer”33, entranhável e
sacrificado:” É muito amor em suas costas, não deixa de colocar tudo o que se
possa aproveitar (a outra pessoa) perderia mil vidas por um bem pequeno seu.”
Em fim, é amor” que vai imitando ao capitão do amor, Jesus, nosso bem”.35
Assim, pois, estas são algumas
chaves que se desprendem da experiência espiritual e sagrada de Teresa de
Jesus, a luz de sua trajetória existencial.
Teresa de Jesus constitui um
testemunho e uma referência “próxima” e “acessível” para nós hoje, tanto no
humano como no espiritual. Sua trajetória pessoal segue oferecendo a todas as
pessoas que busca viver, desde sua verdade mais profunda, o encontro com Deus e
seu compromisso com o presente. O Deus transcendente, que se se fez homem e se
revelou em Jesus Cristo, fazendo da condição humana “lugar de encontro” entre o
humano e o divino, e a “salvou”, abrindo-a uma vida plena, a mesma vida de
Deus.
Termino com um texto de Teresa em
seu Conceito do Amor de Deus, em que descreve a pessoa – ela mesma- que chegou
a união com Deus:
... pede fazer grandes obras a
serviço do nosso Senhor e do próximo, e por esta greve de perder aquele prazer
e alegria, que ainda é vida mais ativa que contemplativa e parece perder se lhe
concede esta petição, quando a alma esta em este estado, nunca deixa de
trabalhar quase juntas Marta e Maria; porque no ativo e que parece exterior,
trabalho o interior, e quando as obras ativas saem desta raiz, são
admiráveis... Porque procedem desta arvore do amor de Deus e só por Ele, sem nenhum
interesse próprio, e estende-se... Para aproveitar muitos, e... dura, não passa
rápido, senão que faz grande operação.
Isto servira a Sua Majestade e
aproveitam muito,... Que verdadeiramente as almas que o Senhor chega aqui,
entendi de alguns, eu não me lembro mais de si mesmo do que se não fosse para
ver se eles ganham ou perdem; basta olhar para servir e agradar ao Senhor. E
porque eles sabem o Seu amor por seus servos, como deixar o seu gosto e bem,
satisfazê-lo em servi-los e dizer-lhes a verdade, de modo que suas almas são
apreendidos, o melhor termo que pode ... ganhar seus próximos estão presentes ,
não mais. Para mais agradar a Deus, eles esquecem-se para eles, e as vidas
perdidas no processo, como fez muitos mártires... Estes esse efeito de alavanca
muito. (CAD 7,3.5)
Muito obrigado.
Fr. Pablo D. Ureta ocd
Argentina
Conferência para Encontro de ALACAR,
em San Salvador, Outubro 2015.